Por Marco Aurélio Máximo Prado.

As transidentidades questionaram boa parte do conhecimento psi e suas legitimidade. A base de sustentação de muitos estatutos científicos vem sendo interrogada a partir das experiências e identidades trans e travestis. A psicologia, a psicanálise e outras práticas, embora interpeladas pelas posições dissidentes, retardaram muito a agir e iniciar sua autocrítica, dado o mal feito destas teorias-práticas sobre as transexualidades e travestilidades. O século XX e as primeiras décadas do XXI foram o apogeu da patologização, psicologização e clinicalização de todas as experiências dissidentes de gênero, tratando de negar a autonomia e a igualdade do direito ao corpo, ao prazer e ao reconhecimento social e político. Essa dívida histórica agora se encontra no epicentro do debate psi contemporâneo e deve ser enfrentada com honestidade científica.

O que o livro de Eduardo Leal Cunha [O que aprender com as transidentidades: psicanálise, gênero e política] nos propõe é essa honestidade. É abrir as portas para uma posição menos hierárquica da psicologia e da psicanálise e refletir sobre com aprender com o conhecimento produzido pelas experiencias trans e travestis no contemporâneo. O livro traz de forma dialógica, posicionada e densa o debate entre gênero, sexualidade e psicanálise. Embora cercado de armadilhas, o trabalho refinado do autor permite um transpasse entre teorias, sensibilidades e argumentações políticas, capazes de fazer navegar leituras inovadoras sobre a questão histórica da própria psicanálise: como escutar as experiencias dissidentes sem cair nas armadilhas da deslegitimação do outro.

Marco Aurélio Máximo Prado é professor do PPGPSI da Universidade Federal de Minas Gerais e coordenador do NUH/UFMG.

Você pode conferir Gab Lamounier e Marco Prado entrevistando Eduardo Leal Cunha no canal do NUH: